terça-feira, 7 de abril de 2015

Constituição reverbera oito séculos de evolução do Estado de direito

"Os valores constitucionais devem ser observados 
durante toda a prestação jurisdicional" 

Brasília – Confira o artigo de autoria do presidente nacional da OAB, Marcus Vinicius Furtado Coêlho, publicado na sexta-feira (03), no portal UOL.

A Carta Magna inglesa foi concebida em um âmbito local e para circunstâncias particulares. No entanto, alcançou uma longevidade nunca imaginada pelos barões que elaboraram o texto. Passados 800 anos, o mundo celebra o marco da luta pela consolidação do Estado de direito.

Em 15 de junho de 1215, era assinado pelo rei João Sem-Terra, historicamente conhecido por suas condutas arbitrárias, o documento que representa o pilar do princípio democrático, das liberdades modernas e do devido processo legal. Revogava-se a máxima medieval de que "diante da justiça do soberano, todas as vozes devem se calar". A partir de então, nenhum homem livre teria sua liberdade ou propriedade sacrificadas sem que fosse observado um procedimento adequado para o julgamento imparcial.

A ideia de Estado de direito é antiga, mas a expressão tem origem mais recente: segundo Tom Bringham, foi o professor A. V. Dicey, da Universidade de Oxford, quem, ao final do século 19, consolidou todos os valores de um Estado de direito nesta única expressão. Na linha do pensamento de Bringham, o núcleo desse princípio é aquele pregado pela Carta Magna inglesa: todas as pessoas dentro do Estado devem orientar-se por leis tornadas públicas e aprovadas pela sociedade a que elas se destinam.

O professor inglês A. V. Dicey cuida do Estado de Direito ou supremacia da lei como um princípio fundamental da Constituição, a ser compreendido em três concepções diferentes, porém correlacionadas e complementares: A impossibilidade de punição ou limitação quanto aos bens, exceto por clara e manifesta violação da lei e obedecido o devido processo legal junto aos tribunais ordinários. A submissão de todos à lei, visto que nenhum ser humano está acima dela, qualquer que seja sua posição social ou condição financeira, estando sempre sujeito à jurisdição. A construção de regras gerais e abstratas e partir de casos particulares.

Os professores Stanley de Smith e Rodney Brazier são incisivos: "qualquer norma que afete a liberdade individual deve ser razoável e justa; [...] onde a lei conferir vasta discricionariedade, devem existir garantias contra o abuso de poder".

Constituição federal

A doutrina constitucional concernente ao Estado de direito é vasta e seu legado está disposto na Constituição democrática brasileira. Nossa carta política garante, em diversas passagens, o devido processo legal.

O contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes, a presunção de inocência, a individualização da pena, a inafastabilidade da jurisdição, a vedação da prova ilícita, a publicidade dos atos processuais e a fundamentação das decisões - esta detalhada, com muita sensatez, pelos dispositivos do Novo Código de Processo Civil -, a assistência de um advogado e outros inúmeros direitos fundamentais que dizem respeito ao procedimento judicial justo estão listados no artigo 5º da Constituição.

Esses valores constitucionais devem ser observados durante toda a prestação jurisdicional. São requisitos para a efetivação da igualdade processual e do direito de defesa. O processo justo é parâmetro civilizatório.

No sistema jurídico contemporâneo, pautado pela proteção dos fundamentais direitos da pessoa humana, o "due process of law" é base e sustentáculo do Estado Democrático de Direito, fruto de uma longa, lenta e penosa construção humana, de cujos benefícios, testados e atestados em séculos de história, não se pode abrir mão.

A Carta Magna, ao prever que "nenhum homem livre será preso, aprisionado ou privado de uma propriedade, ou tornado fora-da-lei, ou exilado, ou de maneira alguma destruído, nem agiremos contra ele ou mandaremos alguém contra ele, a não ser por julgamento legal dos seus pares, ou pela lei da terra", marca uma significativa virada histórica na confirmação do Estado de direito.

São oito séculos de engrandecimento do Estado de direito, da soberania popular e do devido processo legal, princípios reverberados com altivez pela Constituição da República Federativa do Brasil.


Fonte: OAB-CONSELHO FEDERAL

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